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Coluna do Jupa: Nada se salva em Malhação: Vidas Brasileiras
Se esse texto começasse com um tradicional “Vidas Brasileiras estreou cercada de expectativas”, ele começaria com uma grande mentira. A atual temporada de Malhação inegavelmente já entrou no ar desacreditada. O principal motivo foi o fato de ela vir depois da bem recebida Viva a Diferença, de Cao Hamburger. Não havia dúvidas de que a substituta não chegaria perto da qualidade da anterior – como, de fato, não chegou. Também, há de se levar em conta a questão da autoria. Patrícia Moretzsohn vinha da péssima Casa Cheia e ninguém entendeu muito bem por que outro projeto seu foi aprovado depois daquele desastre. Por fim, e talvez menos importante, o fato de, pela primeira vez, Malhação não trazer uma história completamente original, mas sim uma adaptação. No caso, de ’30 Vies’, produto canadense de sucesso. Esses e outros motivos contribuíram para que não fosse depositada muita esperança em Vidas Brasileiras.
A falta de esperança não poderia ser mais justificada. Passados quase 10 meses da estreia, a atual temporada caminha, a passos largos, para se tornar o maior desastre da história da novelinha que já faz parte da história da TV brasileira, sendo um dos produtos mais clássicos desta. Nada se salva em Malhação: Vidas Brasileiras.
Se a temporada anterior era elogiada por retratar bem os dramas adolescentes, na atual isso passa longe de acontecer. Os personagens são completamente rasos e, por isso, seus dramas não convencem. Enquanto acha que cria personagens complexos e humanos, que erram e acertam, o roteiro, na verdade, só entrega personalidades que mudam de acordo com a necessidade da história do momento. Personagens complexos erram, acertam, mas evoluem de forma gradual, não de uma hora pra outra. Há toda uma construção em torno da personalidade deles. Isso, definitivamente, passa longe de Vidas Brasileiras. Um dos principais fatores para isso não acontecer são os arcos quinzenais.
A soberba e o orgulho da autora e de seus colaboradores parecem não tê-los feito enxergar que a história dividida nesses arcos não deu certo. Tudo parece artificial demais, com um problema sendo milagrosamente resolvido para que outro, relativo ao personagem seguinte na fila das ‘quinzenas’, surja. É difícil imaginar que uma história completa envolvendo um personagem específico possa ter início, meio e fim satisfatórios em apenas 10 capítulos – com duração menor do que o de uma novela tradicional. Ainda mais levando em conta que, mesmo que o foco seja nesse personagem, os demais não saem completamente de cena. Na série canadense, deve dar certo por se tratar de um produto com formato diferente, não o de uma ‘novela’.
Por falar nisso, a maior inspiração parece ter sido a figura central de uma professora adulta. Aqui, trata-se da Professora Gabriela, interpretada por Camila Morgado. Já nos primeiros arcos, era possível se perceber que ela cansaria logo. E cansou. Vendida como uma profissional preocupada com os alunos, Gabriela logo virou motivo de chacota por parecer mais uma detetive maluca, capaz até de invadir a privacidade dos seus alunos e seus pais, para tentar resolver um problema que não lhe cabia. Claramente, há, desde o princípio, um problema estrutural na construção da personagem. Oras, como levar a sério uma mãe que deixa os seus filhos de lado para cuidar da vida dos outros? É complicado.
Complicada também é a forma como a temporada trata assuntos mais sérios. Abordar assuntos delicados e atuais é sempre muito bem-vindo e vem se tornando cada vez mais necessário na nossa sociedade. Mas é preciso o mínimo de responsabilidade. A temporada quer, claramente, causar em cima de temas sociais. Aqui, entra novamente o problema de se trazer personagens rasos e contraditórios, o que acaba sendo refletido diretamente nessas histórias. No fim das contas, o roteiro acaba indo para o lado do didatismo e torna tudo maçante. O ponto fora da curva, até o momento, foi o arco do Michael. Mesmo que, antes, o personagem tenha sido um gay caricato que não tinha história e servia apenas como “bolsinha” das patricinhas Pérola e Jade, quando Patrícia enfocou em seu relacionamento com Santiago, houve boas cenas. O maior elogio feito a esse arco é que ele nem parecia ser dessa temporada.
O mesmo não se pode dizer a outras pérolas – com o perdão do trocadilho envolvendo uma das protagonistas. Bárbara, que entrou no arco de Úrsula, sempre foi uma personagem insuportável que mais parecia uma metralhadora de frases prontas e nada naturais. Longe de qualquer realidade foi o arco da pior personagem da temporada, Jade, em sua carreira internacional meteórica. Também não rendeu a quinzena da chatíssima Maria Alice e seu grande mistério. Arcos como os do Alex, Érico, Márcio e do casal Tito e Flora sequer merecem qualquer menção. E o que falar do personagem que inaugurou esse show de horrores? Kavaco e seu icônico verniz de barco. Vidas Brasileiras já chegou mostrando que, assim, não poderia ser levada a sério.
A direção também não se destaca. Muito menos o seu elenco. A maioria dos atores jovens está em seu primeiro trabalho na TV e é difícil já estrear com o pé esquerdo dessa forma, munidos de um roteiro tão fraco, mas, mesmo assim, é possível constatar que, para muitos, não há muito futuro nesta profissão. Felizmente ou infelizmente, fica por conta do leitor.
Tamanho desinteresse é refletido na audiência baixa – a temporada vem perdendo para a Record quase todos os dias, o que inaceitável para um produto de dramaturgia da Globo. Mas não é justo que se julgue apenas pelos números do IBOPE na Grande São Paulo. Pode-se ir além: a repercussão nas redes sociais é quase nula e, quando há, são comentários negativos. Não há nem um casal que consiga se destacar. Numa temporada de Malhação, isso é quase inédito.
Apesar de a abertura clamar todos os dias, ninguém pôs fé em Patrícia e nessa sua empreitada. E as pessoas não poderiam estar mais certas. É uma temporada para ser esquecida. Definitivamente, “agora” não vai.
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